Depois que meu pai faleceu, achei que o pior já tinha passado. Eu não fazia ideia de que minha madrasta e os filhos adultos dela estavam prestes a transformar meu luto em algo ainda pior. Mas minha mãe apareceu com a única coisa que eles jamais esperavam.
Depois que meus pais se separaram, eu fiquei com meu pai.
Não porque eu não amasse minha mãe. Eu amava. Mas ela estava se mudando para outro estado, e eu não queria deixar minha escola, meus amigos ou o quarto em que cresci. Ambos os meus pais entenderam.
Quando meu pai se casou com a Sharon, eu tentei fazer aquilo funcionar. Ela não tentou.
Ela mal me tolerava. Seus sorrisos pareciam falsos, e o tom dela sempre vinha com uma pontada.
Como quando ela dizia: “Você deixou seu prato na pia de novo”, mas com aquela voz doce e enjoada que gritava: *Você não é bem-vinda aqui.*
Os filhos adultos dela, Mark e Lisa, eram tão ruins quanto. Entravam na casa como se fossem os donos, comiam a comida do meu pai, aumentavam o volume da TV e reviravam os olhos para mim como se eu fosse um cachorro de rua que ele ainda não tinha expulsado.
Mas meu pai me defendia.
Sempre.
Ele nunca deixou que eles me maltratassem. Se Sharon ficava irritada, ele desviava. Se Mark, meu meio-irmão, começava com comentários sarcásticos, meu pai o cortava na hora. Ele era o escudo entre mim e todos eles. E isso tornava tudo suportável. Isso fazia daquela casa um lar.
—
Então ele morreu.
Assim, do nada. Um ataque cardíaco em uma terça-feira qualquer. Eu ainda estava em choque quando aconteceu o funeral. Parecia que eu estava flutuando, totalmente desligada.
Todo mundo dizia as mesmas coisas de sempre: *Ele era um bom homem. Ele te amava muito. Agora está em um lugar melhor.* Eu queria gritar com todos eles.
Depois do serviço, eu não queria voltar para casa. Muitas lembranças. Muita tensão. Então, passei a noite na casa da minha melhor amiga, Maddy, a poucos quarteirões de distância.
A família dela entendeu que eu só precisava de um tempo para clarear a cabeça.
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Na manhã seguinte, eu voltei para casa a pé.
Eu devia ter percebido que algo estava errado. A garagem estava vazia, mas a varanda… estava lotada.
Com todas as minhas coisas. Minhas roupas, livros, a foto minha e do meu pai pescando quando eu tinha oito anos, e muito mais, tudo jogado em caixas de papelão como lixo.
Um casaco que eu achava que tinha perdido estava pendurado, caindo de uma das caixas.
Fiquei olhando, confusa. “Mas o que…?”
Larguei minha mochila e corri até a porta.
Trancada.
Girei a maçaneta, bati, bati mais forte. Foi quando a porta se abriu, e Sharon apareceu com os braços cruzados e um sorriso de desprezo no rosto.
Atrás dela, Mark estava encostado na parede do corredor, com um sorrisinho. Lisa estava sentada na escada, mexendo no celular, sem nem me olhar direito.
“Você não achou mesmo que ia continuar morando aqui, achou?” Sharon disse, inclinando a cabeça. “Essa casa é para a família.”
Minha boca abriu, mas não saiu som.
“Essa era a casa do seu pai,” ela continuou. “E agora que ele se foi, como esposa dele, ela é minha. E é hora da minha família seguir em frente. Sugiro que você faça o mesmo.”
Eu estava arrasada. E sem teto. Dias depois de enterrar meu pai.
Sussurrei, “Você tá me expulsando?”
Lisa riu baixinho, finalmente levantando os olhos do celular com um olhar debochado. Mark sorriu do mesmo jeito.
“Você não tem esse direito,” disse eu, com a voz falhando.
Sharon deu uma risada. “Ah, querida. Eu tenho, sim. Agora, por favor, leve suas coisas e vá embora. Se não for, não vou ter escolha a não ser chamar a polícia.”
E com isso, ela fechou a porta na minha cara. Eu sabia que ela falaria sério, então corri para pegar o que pude: minha mochila, uma sacola com roupas e o porta-retrato com a foto minha e do meu pai.
Minhas mãos tremiam tanto que deixei cair a moldura uma vez. Ainda estava no jardim quando senti olhares sobre mim. Nossa vizinha, a Sra. Jenkins, estava na varanda, observando.
Ela se aproximou devagar e disse: “Se você precisar de um lugar, tenho um sofá sobrando.”
Provavelmente eu deveria ter voltado para a casa da Maddy, mas estava tão em choque que mal consegui balbuciar um “obrigada” para aquela senhora tão gentil.
—
Naquela noite, sentei no sofá dela, abraçando os joelhos, a luz da varanda mal iluminando a sala.
Eu me sentia pequena. Perdida. Como se tudo na minha vida tivesse desabado.
Então, peguei o celular. Não queria fazer aquilo.
Minha mãe não tinha conseguido sair do trabalho para vir ao funeral do meu pai. Mas eu simplesmente não sabia mais o que fazer.
Então, liguei para ela.
“Mãe?” Minha voz falhou, e ela ficou preocupada na hora. “Não, eu tô bem. Quer dizer… não muito. É a Sharon… ela trocou as fechaduras. Disse que a casa é para a família e me expulsou.”
“O quê?!”
“Eu sei que você não conseguiu vir por causa do trabalho, mas tô na casa da Sra. Jenkins. Acho que posso pegar um ônibus amanhã—”
“Não,” minha mãe me cortou. “Fique aí. Estarei aí em algumas horas.”
E desligou. Ela dirigiu a noite toda.
Quando acordei por volta das seis da manhã seguinte, ouvi o carro dela estacionar na garagem da Sra. Jenkins. Corri descalça até lá fora.
Ela saiu do carro, e eu pulei nos braços dela.
Por um momento, não dissemos nada. Nem ela, nem eu.
Então, ela se afastou um pouco e me olhou nos olhos.
“Querida, preciso te contar uma coisa. Algo que ele não queria que você soubesse,” ela disse. “E tem mais que ele não queria que a Sharon e os filhos dela soubessem.”
Pisquei. “Como assim?”
Ela respirou fundo. “Filha, eu não fui ao funeral do seu pai por causa… do motivo da nossa separação. Eu traí ele. Ele não ia querer que eu estivesse lá. Terminamos muito mal, mas escondemos isso bem. Nenhum de nós queria que você soubesse a verdade,” ela confessou, desviando o olhar por um segundo. “Eu também tinha muita vergonha.”
“Você só pode estar brincando,” murmurei. Esse não era o momento para uma bomba dessas!
“Eu sei. Fui horrível, mas estou te contando agora porque,” ela pausou, engolindo em seco, “quis reparar de alguma forma. Então, eu quitei toda a hipoteca da casa depois do divórcio, de uma vez só. E, embora a escritura estivesse no meu nome, disse ao seu pai que aquela sempre seria a casa dele. E sua.”
Dei um passo para trás, balançando a cabeça. “O pai deixou você fazer isso? Mesmo depois de…?”
“Sim, mas a intenção dele sempre foi deixar a casa para você um dia,” ela continuou.
“Não acredito nisso.”
“Eu sei que é muita coisa pra absorver,” insistiu minha mãe. “Mas, Cynthia, isso significa que a Sharon não é dona daquela casa, porque seu pai nunca foi. E eu trouxe a escritura comigo para provar.”
Naquele momento, ouvi a voz da Sra. Jenkins. “Por que vocês não entram? Parece que vão precisar resolver um despejo de verdade,” ela disse, com um sorriso gentil.
Finalmente, eu também sorri. “Tá bom,” suspirei.
***
Esperamos até o fim de semana. Sharon e os filhos tinham saído.
Mamãe chamou um chaveiro no sábado de manhã.
Fiquei ali enquanto o homem trocava as fechaduras. Vi minha mãe orientar calmamente uma empresa de mudanças a empacotar os pertences da Sharon e dos filhos — com cuidado — e deixar tudo no gramado.
Na manhã de segunda-feira, ouvi o carro deles chegando.
Nem precisei olhar. Ouvi o grito.
“O que diabos é isso?!” A voz da Sharon cortou o ar como uma sirene.
Mas espreitei pela janela. Ela estava de chinelo, moletom de viagem e com os olhos inchados. Mark gritava atrás dela, e Lisa chorava.
“Essa casa é NOSSA!” Sharon gritou. “ABRE ESSA PORTA AGORA!”
Minha mãe abriu e saiu devagar, segurando a escritura na mão. “Ah,” disse ela, calma como sempre. “Acho que houve um pequeno mal-entendido. Esta casa não é de vocês.”
O queixo da Sharon caiu ao ver o papel. “O que é isso?”
“É a escritura da casa,” minha mãe continuou. “Ela é minha. Veja? Meu ex-marido nunca foi o dono. Então, você expulsou minha filha ilegalmente. Eu só corrigi seu erro.”
Mark fez um som de raiva e tentou empurrá-la.
Mamãe se colocou no caminho. “Se chegar mais perto, eu chamo a polícia.”
Ele parou.
Ficaram nisso por uns dez minutos. Sharon chorava. Lisa caiu sobre uma caixa, chorando dramaticamente. E algum vizinho deve ter chamado a polícia por causa da confusão.
Tivemos que explicar tudo enquanto Sharon, Mark e Lisa tentavam se passar por vítimas. No fim, eles não tinham nada que os defendesse.
Os policiais mandaram que fossem embora, e eles foram forçados a pegar suas coisas e ir embora. Assistimos tudo de dentro de casa.
Quando eles se foram, sentamos no sofá, e eu finalmente consegui respirar.
“Você tá bem?” minha mãe perguntou.
Assenti. “Melhor.”
Ela sorriu. “Agora que isso acabou, vamos colocar a escritura no seu nome assim que você fizer 18. Falta só algumas semanas. Quero garantir um futuro que eles nunca possam tocar.”
Não respondi na hora. Apenas abracei ela.
Naquele momento, não importava o que ela tinha feito no passado. Isso podia esperar.
Por agora, eu só queria relaxar e finalmente poder viver meu luto pelo meu pai… com segurança, na nossa casa.