Eu havia esquecido como era respirar sem checar o celular a cada poucos segundos. Minha irmã quase me empurrou no avião, alegando que eu precisava de uma pausa de administrar minha empresa de software.
Eu estava nesta pequena cidade costeira há três dias, e embora seu charme fosse evidente (passarelas desgastadas e comércios salpicados de sal), eu me sentia deslocado.
Naquela manhã, decidi gastar um pouco da minha energia inquieta correndo pelas ruas pacíficas.
— Senhor, espere! Senhor! Eu conheço você!
Uma garotinha, talvez com uns oito anos, corria na minha direção, seus cabelos selvagens saltitando a cada passo.
— Senhor, venha comigo! Para minha mãe! Vamos!
Eu retirei minha mão suavemente, mas com firmeza, alarmes tocando na minha mente.
— Espere, pequena. Qual é o seu nome? E como você me conhece?
— Meu nome é Miranda! Sua foto está na carteira da minha mãe! Eu vejo o tempo todo!
“Para fins ilustrativos apenas.”
— Miranda, isso é… isso é impossível. Eu não conheço ninguém aqui.
— Sim, você conhece! Você conhece a minha mãe!
— Quem é sua mãe? E por que ela teria minha foto?
— Julia! O nome da minha mãe é Julia! — Ela pulava na ponta dos pés, quase tremendo de empolgação. — Ela olha sua foto às vezes quando acha que eu não estou vendo. Ela fica toda quieta depois.
— Eu vou andar com você, mas nada de segurar na mão, ok? Eu não quero que ninguém pense que eu estou aprontando.
Ela assentiu, aceitando o acordo, e seguiu na frente, olhando para trás a cada poucos passos para conferir se eu estava acompanhando.
Chegamos a uma casa modesta com persianas brancas e um jardim cheio de flores vibrantes.
“Para fins ilustrativos apenas.”
— Mãe! Mãe! Ele está aqui! Ele está aqui! O homem da sua carteira! Ele está aqui!
Miranda reapareceu, praticamente puxando uma mulher com ela.
Quando a mulher me viu, congelou. A palma da mão correu até a boca, e lágrimas encheram seus olhos.
Eu não a reconheci de imediato, até que ela baixou a mão, trazendo à tona oito anos de memórias enterradas.
— Meredith? É você?
— Você foi embora, lembra? — As palavras de Julia saíram ásperas e duras. — Aquele dia no café. Você me disse que não queria estar com alguém que só se importava com o seu dinheiro.
Minha irmã me mostrou documentos — falsos, como descobri depois — indicando que Julia tinha um histórico de procurar homens ricos e dívidas que tentava pagar.
Eu acreditei cegamente em tudo, preocupado demais com meus próprios medos de ser explorado para ver o que estava bem na minha frente.
— Você me acusou de correr atrás de homens ricos e disse que sua irmã te mostrou documentos sobre minhas dívidas. Eu nunca tive dívidas.
— Eu sabia que se te contasse sobre o bebê, só confirmaria as mentiras da sua irmã sobre mim. E eu não podia fazer isso porque eu realmente te amava. E… eu tenho meu orgulho.
Miranda ficou entre nós, a mãozinha pequena segurando a da mãe, parecendo perplexa com a tensão que havia criado. Minha filha!
— Por que ‘Julia’? — consegui perguntar, tentando entender algo naquele momento. — Por que você usava Meredith naquela época?
— Meredith era meu nome do meio. Usei naquele ano porque acabara de perder minha avó. Ela também se chamava Meredith. Achei que você soubesse disso. Mas acho que havia muitas coisas que você não sabia sobre mim. Você estava sempre tão ocupado…
— Eu estava errado — disse, com a voz trêmula. — Sobre tudo. Acreditei em mentiras e deixei que destruíssem a gente. Mas agora… agora quero consertar.
— Mas eu posso estar aqui a partir deste momento, se você deixar. Por Miranda. Por vocês duas.
Os ombros de Julia caíram um pouco.
— Podemos tentar — disse ela, finalmente. — Mas devagar. E ao primeiro sinal de que você vai desaparecer de novo…
Miranda se jogou em mim, envolvendo a cintura com os braços. Depois de algumas hesitações, eu a abracei de volta.
Minha irmã estava certa em uma coisa: eu precisava de férias da minha rotina diária. Mas, em vez de encontrar descanso, descobri algo que eu não sabia que estava perdendo: a oportunidade de recuperar a família que quase perdi para sempre.