**Marina sempre entendeu uma verdade simples:** na família Berezkin, ela sempre seria uma estranha. Não porque Alyosha não a amasse — ele adorava a esposa, via nela apoio e sentido para a vida. Mas por trás desse amor havia uma parede invisível, porém sólida, construída ao longo dos anos por Valentina Petrovna — sua mãe e sogra de Marina.
Anya era o centro do universo para sua mãe. Sua existência justificava cada sacrifício, cada lágrima, cada suspiro. Para Valentina Petrovna, o mundo girava em torno da filha mais nova; o resto era só pano de fundo.
— Alyosha, você sabe como é a nossa Anyutka — repetia ela frequentemente ao filho, achando que Marina não ouvia. — Ela é especial. Diferente de nós. Precisa de mais atenção. Mais cuidados.
Essas palavras feriam Marina. Não por inveja ou ciúmes — ela há muito tempo aceitara o papel de “coadjuvante” naquela família. O que a machucava era outra coisa: ela via aonde aquela devoção cega, quase fanática, estava levando.
Alyosha cresceu responsável não porque queria, mas porque as circunstâncias assim exigiam. Aos treze anos já entregava jornais de manhã, trabalhava após a escola, trazia para casa seu primeiro salário. Os pais justificavam: “Agora temos a Anyutka, precisamos de dinheiro.” Ele nunca discutia. Apenas aceitava tudo em silêncio.
— Lembro quando ele trouxe o primeiro pagamento — contou uma vizinha a Marina. — Valentina Petrovna chorava de emoção e tristeza. E Alyosha, tão sério, parecia até mais velho. A primeira coisa que perguntou foi: “Devo comprar algo para a Anyutka?”
Sete anos se passaram desde o casamento. E nada mudou. Agora, em vez dele, era a própria Valentina Petrovna que achava que o filho havia ganhado uma nova “fonte” — uma esposa com bom salário.
Anya, aos 23 anos, parecia modelo de capa de revista. Cabelos longos, olhos marcantes, cintura fina — a beleza lhe foi dada generosamente. Mas beleza foi o único presente do destino. O resto — trabalho, paciência, persistência — coube ao irmão mais velho.
— Pra que trabalhar em escritório? — dizia ela quando os pais sugeriam que procurasse algo. — Eu não sou o Alyosha. Tenho outros planos.
Cada frase dessas cortava Marina por dentro. Seu marido era um homem inteligente, com coração e força de espírito. Estava construindo uma carreira, conquistando espaço. Merecia respeito, não o tom desprezivo da irmã mais nova.
— Fale com ela — pedia Marina após mais um jantar em família. — Ela precisa entender que o mundo não gira só em torno dela.
Alyosha suspirava e acariciava o cabelo da esposa.
— Marisha, ela ainda está se encontrando. Precisa de tempo.
— Sete anos depois da escola ainda não são suficientes? — ela não se continha. — Alyosha, abre os olhos. Sua irmã não está procurando emprego porque tem certeza de que alguém fará isso por ela.
Ele se calava. Sabia que Marina tinha razão. Mas admitir isso era reconhecer que a família pela qual se sacrificou criou uma egoísta.
A virada foi repentina. Na vida de Anya surgiu Andrei — um homem de 35 anos, relógio caro, modos confiantes e histórias nebulosas sobre negócios. Chegava em carros diferentes — BMW, Mercedes… Tudo nele era bonito, mas… bom demais para ser verdade.
— Mãe, viu o terno dele? — contava Anya encantada. — Soube na hora: é o homem da minha vida!
Valentina Petrovna vibrava. Alyosha ficou desconfiado, mas se calou. Marina, por sua vez, sentiu na hora: havia algo errado.
— Tem alguma coisa errada com ele — disse ao marido. — Tudo é perfeito demais. Por que nunca falou claramente sobre o trabalho?
— Talvez só seja reservado — deu de ombros Alyosha. — Nem todos são abertos como nós dois.
Mas Marina não sossegava. Sua intuição gritava: aquilo ia acabar mal.
Depois de um mês, começaram os “pequenos” pedidos. Andrei pedia dinheiro para gasolina, presentes para sócios, “urgências”. Anya pedia aos pais, que davam o que podiam e depois iam até o filho.
— Alyosha — chorava a mãe —, é a chance dela! Andrei é sério. Só está com dificuldades temporárias.
E Alyosha dava mais dinheiro. Marina ficava calada, mas cada nota entregue era uma pedra no seu coração.
— Isso vai acabar mal — sussurrava à noite. — Estamos indo direto para o abismo.
— O que posso fazer? — respondia ele, exausto. — Proibir o namoro? Ela é adulta.
— Então pare de financiar esse relacionamento.
— E se ele realmente a amar? E se tiverem futuro?
Marina via o sofrimento do marido, dividido entre a família de origem e a que construíram juntos. Ela não dizia mais nada. Guardava mágoas. E esperava o momento em que tudo desabaria.
Esse momento chegou em fevereiro.
Andrei propôs a Anya um “investimento de ouro” — um startup promissor. Bastavam 500 mil rublos. Em seis meses seriam milionários. Casariam. Comprariam uma casa. Uma nova vida.
Anya fez um empréstimo. Entregou o dinheiro. Uma semana depois — silêncio. Telefone desligado. Perfis apagados. Os carros eram alugados. Andrei desapareceu.
Anya entrou em desespero. Valentina Petrovna chorava, culpando o mundo. Mas a dívida ficou. Real, fria, mensal.
— Alyosha — ligava a mãe —, você entende, a Anyutka não vai aguentar. Ajudem, vocês ganham bem…
Marina ouvia cada palavra. E via os lábios do marido se contraírem. Algo dentro dele se partia.
— Mãe, vamos nos encontrar — disse ele por fim. — Precisamos conversar com calma.
O encontro foi na casa dos pais. Anya, com o rosto inchado de tanto chorar, segurava a mão da mãe. Alyosha e Marina sentaram-se à frente.
— Não podemos pagar a dívida toda de uma vez — começou Alyosha —, mas ajudaremos com as parcelas mensais — desde que Anya comece a trabalhar.
— Trabalhar? — soluçou Anya. — Vão rir de mim…
— Ninguém vai rir — disse Marina com firmeza. — Isso está só na sua cabeça. Arrume um trabalho, comece a ganhar — e ajudaremos. Caso contrário, vai viver eternamente às custas do irmão e dos pais.
— Como se atreve?! — gritou Valentina Petrovna. — Ela é minha filha, não sua!
— Justamente por isso cresceu assim — Marina não aguentou mais. — Porque para vocês ela é uma deusa, a quem tudo é permitido.
— Marina! — tentou interrompê-la Alyosha.
— Não, Alyosha — virou-se para ele. — Chega de silêncio. Sua irmã, aos 23 anos, não sabe fazer nada além de ser bonita. Não trabalha, não assume responsabilidades, não vive. E sabe por quê? Porque vocês sempre resolveram tudo por ela.
— E o empréstimo? — chorava Valentina Petrovna.
— É problema dela — disse Marina. — Foi ela quem assinou. Ela quem tem que pagar.
O silêncio caiu na sala. Anya olhava com ódio. A mãe, sem entender. E Alyosha, em silêncio, olhando para o chão.
— Só porque sou sua nora não significa que podem enfiar a mão na minha carteira! — disse Marina firme. — Comprem vocês tudo o que quiserem para sua filha!
O silêncio ficou denso, pesado. E nele, Marina entendeu: algo havia se quebrado naquela família. Talvez para sempre.
— Alyosha — a voz da mãe era baixa, mas carregada de mágoa —, vai deixar sua esposa falar assim com a gente?
Alyosha levantou os olhos lentamente. Marina viu neles a dor que ele carregava há anos. Ele amava a família em que nasceu. Mas também amava Marina — a mulher com quem enfrentou tudo: dificuldades, sacrifícios, lutas por um futuro.
— Mãe — disse finalmente —, a Marina está certa. Ajudamos a Anya a vida inteira. Mas ela não ficou melhor, mais independente ou responsável. Apenas passou a exigir mais.
— Alyosha! — exclamou a mãe.
— Não, mãe, escute. Amo a Anya. Sempre serei seu irmão. Mas não posso mais resolver os problemas dela. Que ela tente, ao menos uma vez, se virar sozinha. Se conseguir um emprego, mesmo o mais simples, ajudaremos com o crédito.
— E se não conseguir? — perguntou Valentina Petrovna.
— Então que enfrente as consequências das próprias escolhas — respondeu ele. — É responsabilidade dela.
Marina segurou a mão do marido. Seus dedos estavam frios, levemente trêmulos.
Dois meses se passaram. Anya não procurou emprego. Nem fingiu tentar mudar. Esperava, como sempre, que alguém viesse salvá-la. Valentina Petrovna andava por bancos, pedia renegociação da dívida, vendia joias herdadas da avó. Mas a dívida não diminuía.
— Alyosha, ajuda só um pouco — pedia ela ao filho. — Eu já não consigo mais…
— A condição continua a mesma — respondia ele com firmeza. — A Anya precisa começar a trabalhar.
— Ela não pode! Está com depressão!
— Mãe, depressão não se cura com dinheiro. Ela precisa de um propósito. De uma atividade. O trabalho é a melhor terapia.
Marina ouvia essas conversas. Via o marido se esgotar. Perder o brilho. Entre eles crescia um muro, feito de problemas que não eram seus.
Uma noite, depois de mais uma ligação, ela foi até ele.
— Alyosha — disse em voz baixa —, sei o quanto está sendo difícil. Mas você precisa fazer uma escolha.
— Que escolha? — perguntou, sem encará-la.
— Entre o passado e o nosso futuro. Entre a família onde nasceu e a que construímos juntos. Alyosha, não posso mais ver você se despedaçando. E não quero fazer parte do que está matando sua irmã por dentro.
— E se eu parar de ajudar, e ela piorar?
— Talvez piore. Mas com o tempo ela vai entender: ninguém mais vai viver por ela. E só então… ela poderá aprender a ser adulta.
Alyosha ficou em silêncio por muito tempo. Depois foi até a janela. Ficou ali, olhando a noite.
— E se eles me odiarem?
— Talvez — respondeu Marina. — Mas é melhor ser odiado por dizer a verdade do que amado por manter uma mentira.
No dia seguinte, Alyosha ligou para a mãe.
— Mãe — disse ele —, eu e a Marina tomamos uma decisão…
Não vamos ajudar com o empréstimo enquanto a Anya não começar a trabalhar. Qualquer trabalho, mesmo que seja só por um mês — aí começaremos a ajudar. Se ela trabalhar por seis meses — pagaremos juntos.
— Lyosha, você enlouqueceu! Ela é sua irmã de sangue!
— Justamente porque ela é minha irmã, eu não posso continuar fazendo por ela o que ela mesma deve fazer. Mãe, entenda — nós não somos inimigos da Anya. Queremos que ela comece a viver a vida de verdade.
— E se o banco processar?
— Então que processe. Isso também faz parte da vida que ela precisa enfrentar.
Valentina Petrovna desligou o telefone. Não ligou mais.
Marina viu como aquilo magoava Lyosha. Sentia cada lágrima dele, cada batida do coração. Mas sabia que não havia outro caminho. E esperava para ver o que aconteceria depois.
A resposta veio um mês depois.
Anya encontrou um trabalho. Simples, mal remunerado — vendedora em uma loja de roupas. Mas ela estava trabalhando. Ganhando dinheiro. E, pela primeira vez na vida, fazia algo com as próprias mãos.
— Lyosh, — chorava ao telefone Valentina Petrovna, — Anetchka está trabalhando! Cansa, mas trabalha. Diz que quer provar para todo mundo que consegue sozinha.
Lyosha olhou para Marina. Ela assentiu.
— Vamos ajudar, mãe. Mas em partes. O resto ela que pague sozinha.
— Obrigada a vocês e à Marina, — sussurrou a mãe.
Quando Lyosha desligou, Marina o abraçou.
— Você acha que vai dar certo? — perguntou ele.
— Não sei. Mas agora ela tem uma chance. Antes, não tinha.
Passou-se um ano. Anya não só manteve o emprego — foi promovida a vendedora sênior. Eles pagavam o empréstimo juntos: a maior parte era paga por Anya, Lyosha ajudava com o restante. Valentina Petrovna sentia um orgulho diferente — não pela beleza da filha, mas pela força dela.
Um dia, Anya encontrou Marina na loja e disse:
— Eu te odiei por muito tempo. Porque você fez o Lyoshka parar de me ajudar.
Marina ficou tensa.
— Mas agora entendo: você estava certa. Se vocês tivessem pago tudo naquela época, eu teria continuado a mesma. E um ano depois tudo teria se repetido.
— Para mim também foi difícil, — admitiu Marina. — Eu via como o Lyosha sofria. Como você sofria. Mas sabia que, se desistíssemos agora, vocês dois perderiam ainda mais.
— Obrigada, Marish. Só agora entendo o que significa ser adulta.
Marina abraçou a cunhada. Pela primeira vez em muitos anos, sentiu que Anya não era só uma parente do marido, mas uma irmã de verdade.