— Por onde andas, égua? «Estamos aqui há uma hora», gritou a tia Zina.

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De repente, uma ligação telefônica irrompeu no silêncio da manhã, quebrando a paz do quarto. Marina, com muita dificuldade, forçou os olhos sonolentos a se abrirem e estendeu a mão para o criado-mudo. Na tela apareceu o nome “Tia Zina”. Seu coração involuntariamente se apertou — afinal, a última conversa entre elas fora mais de um ano atrás, durante a cena escandalosa no aniversário da avó.

— Alô — ela respondeu roucamente, limpando a garganta seca da noite.

— Marininha! Pelo amor de Deus, não desligue! — A voz da tia Zina soava com uma suavidade incomum. — Eu sei que tivemos momentos tensos… Mas eu e o tio Petya vamos visitar Novosibirsk na próxima semana. Tudo bem se ficarmos dois dias na sua casa?

Marina se sentou rapidamente, sacudindo a cabeça para despertar completamente. Imediatamente, as cenas daquele antigo conflito passaram diante de seus olhos.

— Quando é que você vai pensar em casar? — gritou tia Zina naquela época, sem se conter. — Na sua idade, eu já tinha criado dois filhos! E você anda sozinha, só pensa na carreira. Que egoísta! A avó nunca vai ter netos por sua causa!

— Tia Zin — Marina tentou responder, mas parou. — Eu não moro mais em Novosibirsk. Eu me mudei.

— O que quer dizer que se mudou? Para onde? — A voz da tia voltou ao tom autoritário.

— Para Krasnoyarsk. Há três meses.

Do outro lado da linha, houve uma longa pausa, cheia de silêncio e surpresa.

— E você escondeu isso da sua tia? — indignou-se ela. — Sua mãe sabe disso?

— Claro que sabe — respondeu Marina, sentindo a ansiedade crescer dentro de si. — Eu só precisava recomeçar do zero.

— É mesmo? — respondeu tia Zina. — Tudo bem, mas vamos te visitar de qualquer forma. O tio Petya queria muito conhecer Krasnoyarsk. E Dimka e Nastya, seus primos, também querem te ver…

— Tia Zina, não! — Marina quase gritou. — Estou reformando o apartamento!

— Que reforma, que nada! Podemos até dormir no chão — rebateu a tia.

— Por favor, não — implorou Marina. — Estou muito ocupada. E o apartamento é pequeno…

Mas a tia já não ouvia, falando com o tio Petya. A ligação caiu.

Os sete dias seguintes foram um tormento sem fim para Marina. Ela pensava constantemente no caráter de sua tia: quando ela decide algo, nada a detém. O telefone não parava de tocar, mas ela cortava cada ligação metodicamente.

Então, aconteceu o pior. Na manhã de sábado, às sete horas, chegou uma mensagem: “Estamos embaixo do seu prédio. Desce para ajudar com as coisas.”

Marina ficou sem reação. Eles deveriam ter encontrado seu endereço antigo em Novosibirsk. Seus dedos tremiam ao digitar a resposta: “Eu já disse — estou em Krasnoyarsk!”

A resposta veio um minuto depois, seguida por uma ligação furiosa.

— Onde você está, irresponsável?! Estamos esperando há uma hora embaixo do seu apartamento! — gritava a tia, aparentemente já na porta.

Do telefone veio um barulho alto — tia Zina provavelmente havia chegado ao antigo apartamento de Marina e batia na porta.

— Abra imediatamente! Sei que você está em casa! — soou uma voz exigente pelo telefone.

De repente, todos os sons cessaram, e Marina ouviu uma voz masculina desconhecida:

— Que descaramento é esse? Que Marina? Eu moro aqui há seis meses!

— Como assim mora? — exclamou a tia, pasma. — E onde está a Marina?

— Nunca ouvi falar de nenhuma Marina. Se não pararem o barulho, vou chamar a polícia! — cortou o desconhecido.

A ligação caiu. Marina desligou o telefone instintivamente e caiu na cama, exausta. Tremia, com o coração batendo forte nas têmporas. Imaginou a cena: tia Zina com enormes malas diante da porta de um estranho, o tio Petya tentando acalmá-la, Dimka e Nastya provavelmente envergonhados escondidos ali perto…

Só ligou o telefone novamente à noite. Trinta e seis chamadas perdidas da tia, dezessete da mãe e dezenas de mensagens em aplicativos. Primeiro, ligou para a mãe.

— Que teatro você armou — disse ela, cansada. — Tia Zina está em pânico, dizendo que você a enganou de propósito.

— Mãe, eu avisei para não virem — respondeu Marina baixinho. — Você entende como ela me pressiona…

A mãe suspirou fundo:

— Entendo. Mas, ainda assim, são família.

— Família não deveria causar dor — respondeu firme Marina. — Não quero mais ouvir que sou “errada”, que é hora de casar, ter filhos, esquecer a carreira… Eu sou diferente, e isso é normal.

No telefone, houve um silêncio tão profundo que Marina pôde ouvir a respiração da mãe.

— Você está certa — disse ela inesperadamente. — Já quis dizer isso há muito tempo… Desculpe por não te proteger dos ataques da tia. É que ela é irmã mais velha, e eu sempre estive acostumada a obedecê-la. Sempre foi assim: ela manda, eu concordo.

Marina ficou emocionada:

— Obrigada, mãe. Você não imagina o quanto isso significa para mim.

— Sabe — a voz da mãe tremeu — eu também sonhei um dia… Queria entrar para a faculdade de teatro. Mas tia Zina disse que isso era “coisa de criança”, que eu devia pensar em casar. Casei com seu pai aos dezenove…

— Você se arrepende?

— Não, jamais! Você nasceu — e isso é o mais importante da minha vida. Mas às vezes penso: e se eu tivesse insistido? Talvez eu teria atuado e te gerado. Não precisa escolher entre as duas coisas.

Marina sorriu com lágrimas nos olhos:

— Sabe, mãe, nunca é tarde para tentar. No teatro amador sempre precisam de atores.

— Ah, minha idade…

— Lembra o que você me dizia quando eu era pequena? “Nunca diga ‘tarde demais’, diga ‘é hora’.”

Krasnoyarsk a recebeu com um outono suave. O novo emprego numa empresa de TI consumiu toda sua atenção — ela se lançou em projetos, matriculou-se em cursos de web design. À noite, caminhava pela orla do rio Yenisei, descobrindo a nova cidade que aos poucos se tornava seu lar.

No escritório, era vista como estranha: não fumava com os colegas, não fofocava perto da máquina de café, não reclamava da vida. Em vez disso, trabalhava até tarde, estudando novas tecnologias, ou se trancava na sala de reuniões com fones, fazendo cursos online.

— Você é igual a um robô — disse certa vez Svetlana, do setor financeiro. — Só trabalho, nada mais. Quando vai começar a viver?

Marina deu de ombros. Era difícil explicar que só agora começava a se sentir realmente viva — sem a pressão das expectativas alheias.

No início do inverno, chegou ao departamento um novo colega — Gleb. Alto, meio desajeitado, mas com olhar caloroso e senso de humor incrível. Ele nunca perguntou sobre sua vida pessoal, nem falou que devia “se estabelecer”. Um dia, deixou uma rosquinha em sua mesa:

— Você pulou o almoço. O cérebro funciona pior sem glicose.

Mais tarde, encontraram-se no supermercado perto de casa — moravam em prédios vizinhos. Gleb carregava um saco enorme de ração para gatos.

— Três bichanos — confessou meio envergonhado. — Adotei no abrigo, não consegui escolher só um.

E Marina, para sua surpresa, contou tudo: a história da tia Zina, a mudança para Krasnoyarsk, o medo de ser ela mesma. Passaram a noite no banco do pátio, congelando, mas felizes pela proximidade recém-descoberta, por poderem falar livremente e serem ouvidos.

Com o tempo, os fins de semana passaram a ser juntos. Andavam pela cidade coberta de neve, faziam cafés da manhã engraçados, assistiam filmes antigos enrolados em um cobertor. Gleb a ensinava a andar de snowboard, e ela o ajudava com programas de edição gráfica. Aprendiam o mais importante — confiar um no outro.

Na primavera, conheceram os pais de Gleb. Marina estava apreensiva — experiências passadas a fizeram temer julgamentos. Mas a mãe de Gleb apenas a abraçou e disse:

— Que encantadora você é. E os olhos, tão inteligentes. O Gleb teve muita sorte.

À noite, enquanto tomavam chá na varanda, o pai de Gleb perguntou:

— Por que escolheu Krasnoyarsk?

Marina se tencionou, mas ele continuou:

— Eu também larguei tudo e me mudei uma vez. Foi a melhor decisão da minha vida. Às vezes, é preciso salvar a si mesmo, não é?

No verão, casaram-se. Sem festas luxuosas — só registraram a união no cartório e fizeram um piquenique na beira do Yenisei com amigos próximos. A mãe veio de Novosibirsk e abraçou os dois:

— Vocês são tão felizes…

Claro que tia Zina enviou uma série de mensagens indignadas: “Nem convidou a família para o próprio casamento! Perdeu toda a vergonha! O vestido era branco pelo menos? Ou você se casou de jeans, como está na moda?”

Marina não respondeu. Estava usando seu jeans favorito com bordado feito por ela, uma blusa branca e uma coroa de flores do campo. E aquilo parecia perfeito para ela.

A mãe ficou uma semana em Krasnoyarsk. Numa noite, sentadas na varanda do apartamento dela e Gleb, de repente disse:

— Me inscrevi numa escola de teatro.

— O quê?! — Marina quase derramou o chá de surpresa.

— Só para aulas de dicção por enquanto. Mas sabe… sinto que estou ganhando asas.

Ficaram em silêncio, observando o pôr do sol sobre o Yenisei.

— E tia Zina? — Marina perguntou.

— Nem contei a ela — a mãe piscou com um sorriso misterioso. — Estou aprendendo a ser livre, como você.

No outono, Marina foi promovida — virou diretora de arte na empresa. Agora tinha sua equipe, projetos, vitórias e derrotas. Aprendeu a dizer “não” quando necessário, e “sim” quando o coração mandava.

Gleb sempre apoiava suas decisões. Quando a dúvida a dominava, ele a abraçava e dizia:

— Você consegue. Você é incrivelmente forte.

E ela realmente conseguia.

Em dezembro, chegou mensagem de Nastya, prima dela: “Sabe, você tinha razão em ir embora. Eu também quero achar meu caminho. Minha mãe está furiosa — diz que moças decentes não escolhem direção de arte. Mas eu não quero mais ser só ‘decente’. Quero ser feliz.”

Marina sorriu e respondeu: “Venha. Só não conte para a tia — você decide tudo. Aliás, tenho um sofá livre.”

Nastya chegou uma semana depois — com uma mochila cheia de medos e esperanças. Conversaram muito naquela noite — sobre sonhos, o direito de ser quem se é, sobre família que não é só quem cria, mas quem ajuda a crescer.

— Sabe — confessou Nastya antes de dormir — eu achava que você era egoísta. Agora entendo: você é só corajosa.

Na primavera, Marina descobriu que estava grávida. Aconteceu naturalmente, sem planos claros. Simplesmente era a hora.

De alguma forma, tia Zina descobriu — provavelmente por conhecidos em comum. Ligou depois de dois anos em silêncio:

— Finalmente começou a viver direito! — disse triunfante. — Eu avisei: o sentido da mulher é…

Marina interrompeu suavemente:

— Tia Zina, eu não comecei a “viver direito”. Eu apenas vivo. Vou ter um filho não porque “devo”, mas porque quero. Vou criá-lo como achar melhor.

— Como ousa… — tia tentou começar.

— Ouso — respondeu firme Marina. — E sabe do que sou grata?

— Gratidão? — espantou-se tia.

— Por mostrar quem não quero ser. Cada crítica sua me fortaleceu. Cada julgamento aumentou minha certeza da minha escolha. Obrigada por isso.

E desligou.

Agora, à noite, Marina e Gleb sentam na varanda, tomam chá e fazem planos. Sobre viagens, sobre o quarto do bebê, sobre ensinar a criança a ser ela mesma. A mãe os visita todo mês — atua no teatro amador e brilha de felicidade. Nastya entrou na faculdade de direção e faz curtas-metragens. E tia Zina… Bem, cada um tem seu destino.

Às vezes, é preciso ir longe para entender quem você é. Às vezes, romper os velhos laços para criar novos e verdadeiros. E às vezes, só é preciso permitir-se ser você mesmo, mesmo que alguém não goste.

Marina lembra daquela garota que, há dois anos, deixou a cidade natal para fugir das expectativas alheias. Quanta medo e perda ela sentia. Se pudesse falar com ela do futuro, diria: “Aguenta firme, menina. Vai dar tudo certo. Melhor do que imagina.”

E então ela acaricia a barriga já visivelmente arredondada e sussurra:

— E você, pequenino, ninguém jamais vai te obrigar a ser ‘certinho’. Eu prometo.

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