Sou mendigo e os meus filhos e netos esperam há 10 anos que eu morra para ficar com o meu apartamento. Eles queriam que eu fosse para a casa dos idosos, mas eu não fui.

Histórias interessantes

Hoje no supermercado, testemunhei por acaso uma história comovente e, ao mesmo tempo, triste.

Uma senhora idosa chamou minha atenção ao examinar cuidadosamente os preços das latas de conserva mais baratas. Sua aparência e comportamento me fizeram refletir: apesar do frio — fazia apenas 2 graus — ela usava chinelos de borracha, totalmente inadequados para o outono ou inverno. Parecia solitária, perdida, mas escolhia cada lata com tanto cuidado, como se sua vida dependesse disso.

Sem pensar muito, me aproximei e ofereci ajuda. Primeiro, apenas expliquei a diferença de preços entre os produtos, depois comecei a acompanhá-la pelos corredores, enchendo o carrinho com alimentos. Queria tornar aquele dia um pouco mais leve para ela, mesmo que, à primeira vista, isso parecesse apenas um gesto de bondade.

Conforme o carrinho ia ficando mais cheio, a senhora repetia com frequência: “Ai, filho, não precisa, não vão me deixar passar no caixa, não tenho dinheiro.” Demorou um pouco para convencê-la de que eu realmente pagaria tudo e que ela poderia escolher o que quisesse. Só então ela entendeu que não era uma brincadeira. Pela primeira vez em muito tempo, ela podia pegar algo que desejava há tempos. E com os olhos quase marejados, ela escolheu… manteiga e arroz. Produtos simples, que para nós são comuns, mas que, para ela, foram um presente.

Perguntei o que faltava em casa. A resposta foi assustadora: faltava tudo. Completamente tudo. Nenhuma comida, nem mesmo pão. As últimas latas de conserva tinham acabado há alguns dias. Quando coloquei no carrinho algumas barras de chocolate, os olhos dela brilharam. Era aquela alegria pura de criança que eu só via na minha irmãzinha de três anos ao ganhar um doce. Descobri que a vovó adorava chocolate, mas fazia cinco anos que não se permitia comprar.

Enquanto caminhávamos para o caixa, ela não sabia como agir: ora recusava os produtos, ora me pedia para dizer que era seu sobrinho, com medo de os funcionários não permitirem que levasse as compras, ora agradecia e fazia o sinal da cruz. Seu medo da caixa não era vergonha das pessoas, mas fruto de experiências amargas — uma vez, realmente se recusaram a atendê-la porque estava comprando só duas latas e um pão, que somavam 180 rublos.

Soube então que ela não saía de casa há um mês inteiro. Sobreviveu apenas com o que restava — conservas que já tinham acabado. Contou que, sempre que sai de casa, reza a Deus pedindo pelo menos cem rublos para comprar comida. Às vezes, encontrava esse dinheiro na rua, como se fosse resposta divina. E agora, tinha diante dela mais alimentos do que via há anos. “Sabe, filho — disse ela —, sempre que saio de casa, peço a Deus cem rublos pra comer. Às vezes encontro na rua… Mas você me deu tanto…”

Essas palavras mexeram profundamente comigo. Senti uma vergonha imensa por saber que alguém que viveu tanto, que teve uma vida inteira, agora precisava contar com a sorte e a misericórdia dos outros para comer. Me ofereci para levá-la em casa. No caminho, conversamos bastante. Descobri que ela mora num prédio de tijolos, bem localizado, no cruzamento da avenida Leninski e rua Udaltzova. Um bairro moderno, edifício de padrão elevado. Mas por dentro daquele apartamento — uma tragédia silenciosa.

Ela explicou que recebeu aquele apartamento após a demolição do velho prédio onde morou por muitos anos. Agora, vive sozinha ali. A casa está em estado de abandono: no chão, há papelão no lugar do piso, os eletrodomésticos da cozinha foram arrancados. Tudo isso feito pelos próprios parentes — irmã e nora — logo após a morte do filho dela. Levaram tudo o que podiam e nunca mais voltaram. Estão apenas esperando sua morte para herdar o apartamento. Como é viver sabendo que seus próprios parentes esperam sua morte?

Entendi então por que a aposentadoria dela não dava nem para a comida. As contas de um prédio como aquele — porteiro, elevador, condomínio — são o dobro do que se paga num prédio simples. E ela não tem outro lugar. Mudar é arriscado — pessoas idosas são frequentemente enganadas, e às vezes até assassinadas por golpistas. Ela não tem chances. E mesmo que tivesse, teria medo.

E então, aquele simples carrinho de compras que garantiria comida por um mês inteiro custou apenas 3.000 rublos! Será que ninguém, entre tantos vizinhos num prédio de classe média alta, poderia ter ajudado uma senhora a não morrer de fome? Ela trabalhou num instituto científico ligado ao programa espacial. Olhei fotos antigas — era linda, inteligente, uma especialista talentosa. E agora, esse final de vida…

A irmã liga a cada seis meses, só para perguntar se ela ainda está viva. Ao saber que sim, pragueja e desliga. Ela tem neto, nora — todos esperando a herança. Mas eu fiz uma promessa: vocês não vão conseguir. A vovó vai ter tudo: comida, roupas, remédios, quem sabe até uma viagem a um spa. Ela vai viver mais que todos eles. Farei tudo ao meu alcance.

Na despedida, ela me disse tantas palavras doces que fiquei constrangido. Deu vontade de chorar, agradecer, pedir desculpas por este mundo que a deixou tão sozinha. Disse que voltaria a visitá-la. Assim que cheguei em casa, abri o Telegram e vi que um amigo postara uma história parecida. Mais uma pessoa presenciando a mesma dor. E não é um caso isolado — é um sintoma do nosso tempo.

Um idoso pode morrer de fome dentro de casa, enquanto todos os vizinhos sabem da situação e cada um teria a chance de prolongar sua vida com um pequeno gesto. Mas ninguém se importa. Simplesmente não se importam. Quando ele morrer, médicos virão, vão preencher os papéis, e acabou. E pronto. Morre de fome e ninguém liga. Século XXI. Moscou. Pelo amor de Deus.

À noite, não consegui dormir. Minha mente revivia palavras soltas, imagens da juventude daquela senhora — bonita, bem-sucedida — e a triste realidade atual — fria, solitária, faminta. Por que o mundo é tão injusto? Por que pessoas que dedicaram a vida à ciência, ao país, têm que passar seus últimos dias na miséria e solidão, cercadas por parentes gananciosos que só pensam na sua morte?

A decisão veio naturalmente. Eu não podia simplesmente ignorar. Liguei para um amigo que tem um pequeno negócio com alimentos. Contei a história, e ele, sem hesitar, aceitou fornecer uma cesta básica todo mês para a vovó. Juntei outros amigos dispostos a ajudar com remédios e necessidades do dia a dia.

Uma semana depois, voltei a visitá-la. Ela ficou feliz como se eu fosse seu neto de verdade. Levei alimentos, remédios e um novo par de calçados quentes. Organizei uma pequena limpeza no apartamento, chamei um técnico que consertou o fogão quebrado. A vovó estava radiante, seus olhos brilhavam de novo.

Eu sabia que era só o começo. Era preciso cuidar da questão legal com os parentes, protegê-la da cobiça deles. Encontrei um bom advogado que topou ajudar. Pouco a pouco, a vida da vovó foi entrando nos eixos. E cada vez que eu via aquele sorriso no rosto dela, entendia que fiz a escolha certa. Que mesmo num mundo tão indiferente, ainda há espaço para compaixão. Que um pequeno gesto pode transformar uma vida inteira.

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